Baianos esperavam milhares de reais, mas só têm centavos a receber do Banco Central

Divulgação de valores a serem resgatados movimentou lan houses; saiba consultar

csm_Moedas_em_Real_Marcello_Casal_Jr_AGencia_Brasil_17d5996096O pote no final do arco-íris dos baianos só tinha moedinhas ou estava vazio
(Marcello Casal Jr./Agência Brasil) 

A notícia de que o Banco Central (BC) liberaria R$ 8 bilhões em valores esquecidos pelos brasileiros encheu de clientes a Lan House e Variedades, no centro de Iaçu. Nos últimos seis dias, foram 20 pessoas, mas só duas tinham nas contas paradas o suficiente para compensar o preço do serviço – R$ 10. O restante era herdeira de centavos: R$ 0,40, R$ 0,20, R$ 0,16, R$ 0,08 e, o menor de todos, R$ 0,02.

O BC anunciou em janeiro que liberaria os bilhões abandonados em contas pessoais ou empresariais. Em fevereiro, já era possível conferir se havia ou não algum valor a ser resgatado, sem as cifras especificadas. Na última segunda-feira (7), as quantias foram reveladas. O último lote foi disponibilizado para consulta nesta segunda-feira (21), para os nascidos após 1983.

Como a consulta foi aberta inicialmente para as pessoas que nasceram – ou empresas que foram criadas – antes de 1968, a Lan House e Variedades e outros estabelecimentos semelhantes no interior lotaram de clientes com idades acima dos 54 anos.

Nem foi preciso que Rhuan Reis, 29, o dono desta que é uma das três lan houser de Iaçu, onde moram 23,9 mil habitantes, fizesse publicidade sobre o serviço de auxiliar aqueles que queriam conferir o valor de saque. “Foi no ‘boca a boca’ mesmo. Vieram pessoas que não sabiam mexer direito [no site], não se digitalizaram”.

Elas chegavam lá com a esperança de centenas, milhares ou milhões de reais, no cenário mais idealizado. E saíam com centavos – ou com prejuízo.

Critérios
Há critérios a serem cumpridos para a consulta e a liberação do valor (conferira no quadro ao lado) e pode ser preciso ir à respectiva agência bancária para resolver pendências como liberar o uso do aplicativo do banco.

“Nessa, o cara gasta R$ 30 de gasolina, paga o serviço, e tem dois centavos para receber”, diz Rhuan, que estava até pior do que os clientes, porque nem centavos a sacar tinha. A lan house, no entanto, teve mais sorte.

Quando o BC possibilitou, no mês passado, que os brasileiros conferissem se tinham valores a receber, mais de 100 milhões buscaram o site da instituição. A quantidade de pessoas que já acessaram a plataforma, nesta fase, para saber a quantia, não foi informada.

Rhuan_personagem_valores_do_BC_Acervo_pessoal (1)Rhuan diz que movimento em sua lan house cresceu após comvocação do BC (Foto: Acervo Pessoal)

Serão, agora, R$ 4 bilhões disponíveis para 28 milhões de CPFs e CNPJs – R$ 142.8 mil para cada um destes, na média matemática, mas, na realidade, os valores passaram longe, como testemunharam os clientes de Rhuan.

Quem tinha centavos em conta riu de nervoso e deixou o valor lá, novamente esquecido, como fez no passado.

Quais são as próximas etapas para receber dinheiro esquecido?
Depois de etapas que pareciam não ter fim, Washington Sena, 56, descobriu que tinha três centavos para sacar. Ele fez a consulta na expectativa de que houvesse uma resposta para uma história que o pai contava a ele e seus dois irmãos.

Valfredo [o pai de Washington] costumava dizer que, por exigência de um banco, tinha aberto uma poupança, que pôs no nome dos três filhos. Como os dois irmãos de Washington fizeram a consulta no site do BC e não possuíam valores a receber, ele imaginou que, por ser o primogênito, talvez fosse o correntista.

Na verdade, não era – o mistério da poupança continua. Os R$ 0,03 consultados pelo engenheiro sanitarista eram o último resquício de uma conta fechada.
“Achei uma palhaçada, porque o governo federal sabia que a grande maioria das pessoas, talvez quase todo mundo, teria centavos para receber, e se criou essa expectativa”, afirma.

Para ele, deveria ter sido pensado um sistema que facilitasse a consulta e possibilitasse a doação imediata a instituições de caridade no caso de pessoas que possuíssem centavos a receber. “Se um milhão de pessoas doassem seus centavos, seria algo fantástico […]. Mas deixa eu te dizer, mandei devolver os três centavos, depois desse desaforo todo”, diz.

Na primeira rodada de saques, constavam dinheiro proveniente de contas fechadas, tarifas e parcelas cobradas indevidamente, cooperativas de crédito e consórcios encerrados. Na fase iniciada ao longo desta semana, estarão valores esquecidos por outros motivos.

Em maio, mais R$ 4 bilhões esquecidos serão disponibilizados para saque. Se a população geral está frustrada ao descobrir os centavos a sacar, os donos de lan houses, estabelecimentos que fizeram sucesso nos anos 90 e 2000, têm outra opinião.

Em Andaraí, na Chapada Diamantina, o movimento de pessoas que queriam se informar sobre quantias a sacar foi o maior do ano na única lan house da cidade, a HD Informática. Desde a busca pelo Auxílio Emergencial, no início da pandemia, é o maior fluxo de clientes registrado pelo proprietário, Hugo Bacelar, 30.

“Praticamente todo mundo que não tinha acesso à internet veio para cá. Foi uma fila imensa mesmo”.

Por sigilo, ele preferiu não informar se as pessoas tinham valores a receber. Mas, dise que, para as lan house que sobreviveram na Bahia, foi e será, enquanto o último centavo não for sacado, um “ótimo negócio”.

Em Salvador, a dona de casa Valdizete Menezes, 52 não precisou se deslocar até uma lan, mas passou os dias ansiosa para saber quanto seria devolvido a ela. A notícia foi dada por sua filha, que a ajudou no trâmite: apenas R$ 0,45.

Ao contar o que sentiu, Valdizete não conseguiu esconder a decepção. “É um valor muito pouco. Eu encerrei a conta nesse banco há 15 anos já. Se fosse alguma dívida que eu tivesse, tenho certeza que o valor estaria em milhões”, conta a dona de casa.

Já o gestor de suprimentos e armazéns, Andrei Santana, 38, não esperava que teria alguma quantia a receber, mesmo assim, resolveu consultar seu nome. Ao descobrir que estava entre os soteropolitanos sortudos, ficou na expectativa, mas logo se frustrou pelo valor que o aguardava, apenas R$ 0,01.

“Mesmo sabendo que dificilmente receberia algo, fica a frustração. Poderiam ter dito logo que não havia nada a receber, do que criar expectativa nas pessoas”, diz.

Como consultar valores a receber?*

1 – Acessar o site valoresareceber.bcb.gov.br na data e no período de saque informado na primeira consulta. Quem esqueceu a data pode repetir o processo;
2 – Fazer login com a conta Gov.br (nível prata ou ouro). Se o cidadão ainda não tiver conta nesse nível, deve fazer o cadastro ou aumentar o nível de segurança (no caso de contas tipo bronze) no site ou no aplicativo Gov.br. O BC aconselha ao correntista não deixar para criar a conta e ajustar o nível no dia de agendar o resgate.
3 – Ler e aceitar o termo de responsabilidade
4 – Verificar o valor a receber, a instituição que deve devolver o valor e a origem (tipo) do valor. O sistema poderá fornecer informações adicionais, se for o caso;
5 – Clicar na opção indicada pelo sistema: “Solicitar por aqui”: para devolução do valor via Pix em até 12 dias úteis. O usuário deverá escolher uma das chaves Pix e informar os dados pessoais e guardar o número de protocolo, caso precise entrar em contato com a instituição. Ou “Solicitar via instituição”: a instituição financeira não oferece a devolução por Pix. O usuário deverá entrar em contato pelo telefone ou e-mail informado para combinar com a instituição a forma de retirada.

Importante: Na tela de informações dos valores a receber, o cidadão deve consultar os canais de atendimento da instituição clicando no nome dela.

Fonte: Agência Brasil

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