Empresas vão investir R$ 4 bilhões em campos maduros de petróleo na Bahia

Áreas produtoras de óleo e gás em terra na Bahia mudam de perspectivas com novos investimentos

A PetroRecôncavo – produtora independente de óleo e gás com mais de 24 anos de atuação – anunciou, no início do mês, o investimento em uma nova unidade para processamento de gás natural na Bahia. O local escolhido para receber a nova Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) da empresa é o distrito de Miranga, em Pojuca, um dos mais importantes polos produtores de petróleo do estado. A empresa anunciou um investimento estimado de US$ 60 milhões, aproximadamente R$ 340 milhões, na construção de sua segunda unidade de tratamento de gás na Bahia.

Produção em áreas de empresas independentes chega a dobrar de volume Crédito: Divulgação

Este é o maior investimento em uma única instalação industrial da empresa baiana, representando um avanço significativo em sua atuação no segmento de midstream – que envolve o transporte, o armazenamento e o processamento de óleo e gás. A nova UPGN terá uma capacidade de processamento de 950 mil metros cúbicos (m³) por dia, com potencial de expansão para até 1,5 milhão de m³/dia e potencial para o tratamento e o processamento do gás natural de todos os ativos operados pela Companhia que não estão interligados à outra unidade de tratamento da empresa no estado, a UTG São Roque.

Para a empresa, a decisão de investimento representa um passo importante na estratégia de desenvolvimento das reservas de gás natural, possibilitando a verticalização completa das atividades. A iniciativa aumenta a competitividade da companhia, reduzindo a dependência de terceiros e os custos de processamento de gás. Mas, para a economia baiana, investimentos como o da PetroRecôncavo representam uma luz no final do túnel em uma das atividades econômicas mais importantes para o estado no século passado, e que vinha sofrendo há algum tempo os efeitos do abandono por parte da Petrobras.

O processo de retomada da produção de óleo e gás em áreas terrestres na Bahia, conhecidas no meio como onshore, passa tanto pelo investimento de empresas privadas, como da própria Petrobras, destaca Aline Lobo, que é coordenadora do Sebrae Energia. Ela atua como líder do Polo de Referência de Óleo e Gás Onshore e Gestora de Projetos para inserção de pequenas empresas na cadeia de suprimentos do setor de Óleo, Gás e Energias Renováveis. “A Bahia já produziu mais de 100 mil de barris de óleo equivalente por dia (boe/dia, que representa a soma de petróleo e gás natural) há 10 anos. Atualmente, a produção encontra-se na ordem de 40 mil boe/dia. Ou seja, houve um período de desinvestimentos na indústria de óleo e gás um período que se encerrou com o retorno da Petrobras para atuar no onshore da Bahia”, aponta Aline.

Prova disso, complementa ela, foi que a empresa anunciou, em abril deste ano, a contratação de quatro sondas de grande porte, que vão perfurar poços de produção de petróleo e gás onshore (em terra) nos campos de Araçás, Fazenda Azevedo, Massapê, Taquipe, Fazenda Boa Esperança, entre outros, na Bahia. Somente estes equipamentos envolvem investimentos acima de R$ 1 bilhão.

A novidade é que, além da estatal, estão previstos investimentos de empresas privadas na produção de óleo e gás que ultrapassam os R$ 4 bilhões, destaca Aline Lobo, citando números da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP). Poços que, no passado, eram recebendo investimentos de empresas como a 3R, Alvopetro, Brasil Refinarias, Energizzi Energias, Geopark Brasil, Origem Energia, PetroRecôncavo, Petrosynergy, Recôncavo E&P, Recôncavo Energia, Santana, Slim Drilling, SPE Miranga e SPE Tiêta.

“Os municípios são muito impactados pelas atividades de óleo e gás, em geral a renda e a massa salarial nos locais onde há exploração e produção de petróleo e gás são 40% superior dos que não tem atividades petrolíferas”, explica Aline Lobo.

Além da geração de empregos e renda, a atividade paga royalties aos municípios onde a atividade é realizada. De janeiro a outubro deste ano, o governo estadual recebeu mais de R$ 165 milhões em royalties, enquanto os municípios baianos, juntos, cerca de R$ 450 milhões no período. Além disso, as operadoras também fazem investimentos para fazer compensações ambientais e sociais, destaca a coordenadora do Sebrae Energia.

Aline ressalta o papel potencializador da atividade para micro e pequenas empresas. “As pequenas empresas têm dois tipos de oportunidades no setor de petróleo e gás, tanto na cadeia de fornecedores e no Efeito Renda”, diz.

João Vitor Moreira, vice-presidente comercial e de novos negócios, conta que em 2021 a PetroRecôncavo adquiriu dos polos de produção da Petrobras e um deles veio com a concessão de Miranga, que sempre foi o maior produtor terrestre de gás da Bahia, mas vinha no fim de sua vida útil. “O que fizemos foi renovar a concessão, não só deles, mais de vários outros, por 27 anos, que é o máximo”, conta, demonstrando uma aposta da empresa na região. O objetivo é investir no crescimento da produção que deverá ter dois destinos. O gás seco será vendido à Bahiagás, enquanto os líquidos serão extraídos para a produção de gás de cozinha.

Para João Vitor Moreira, a transferência de áreas pouco interessantes para a Petrobras à iniciativa privada representam um importante serviço ao estado. “Olha o trabalho gigantesco que a Petrobras faz no pré-sal. Com o tamanho que tem, não faz sentido para ela. Um poço em Búzios (no pré-sal) entrega mais do que toda a bacia do Recôncavo, com 35 mil barris por dia”, compara. “Por outro lado, para empresas como a nossa é muito interessante, porque temos uma estrutura de custos muito enxuta”.

A empresa assumiu Miranga em dezembro de 2021. De lá para cá, o volume de produção dobrou, conta. E segundo Moreira, ainda há muito a produzir por lá. “Estamos falando de um petróleo leve, parafínico, e um gás natural muito bom, que demanda pouco tratamento”, explica.

Atualmente, a PetroRecôncavo emprega mais de 1,7 mil pessoas diretamente na Bahia e no Rio Grande do Norte. A nova planta deve demandar 400 empregos diretos.

Segundo o vice-presidente da empresa, o investimento anunciado na nova base é apenas parte dos recursos que a empresa aplica na região. “Além do investimento anunciado, temos investido muito na própria produção. Todos os anos investimos valores maiores que este para incrementar a produção e reforçar esta vocação da Bahia”.

Movimento de retomada

“Nós tivemos uma queda significativa no volume de produção aqui no estado, mas estamos falando de um produto que ainda hoje é bastante relevante economicamente para o estado e diversos municípios”, avalia Miguel Andrade, membro do conselho de Petróleo, Gás e Energia da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) e executivo no Senai Cimatec. Ele explica que o petróleo baiano possui uma característica econômica muito importante, por ser um produto de base parafínica. Segundo ele, a parafina baiana é de uma alta qualidade tão alta que pode ser usada para revestir alimentos, sem prejuízos ao organismo humano. “O petróleo baiano tem essa característica, o que lhe dá um preço no mercado internacional extremamente relevante”, diz, lembrando também que o óleo dos poços baianos possui um baixo teor de enxofre, que é um contaminante.

Miguel Andrade diz que o processo de declínio na produção em campos maduros é um processo natural. Entretanto, defende, é preciso revisitar os reservatórios porque novos campos podem ser descobertos. “Há sinalizações de que isso vai acontecer, de que teremos mais sondas de perfuração no território baiano, este processo é fundamental”, aponta. “Cada sonda que é usada para a exploração tem o potencial de gerar 80 novos empregos. Se forem três sondas, são 240 empregos diretos. Cada um gera um outro número maior de indiretos”, destaca.

Andrade acredita que a Bahia precisa agilizar as análises dos pedidos de licenciamentos ambientais. “A gente tem contatos com empresas que querem investir e se queixam da demora em obterem respostas. Por outro lado, temos relatos de que os órgãos responsáveis pela análise dos pedidos possuem quadros de pessoal muito enxutos e não conseguem responder com a agilidade necessária. Isso é algo que precisa ser visto com muita atenção pelas autoridades”, acredita.

Miguel Andrade defende que a busca por novos poços de petróleo se dê tanto na tradicional bacia do Recôncavo, quando em outras áreas como na bacia de Tucano e do Jacuípe. “Precisamos olhar para novas áreas. Temos a bacia do Jacuípe, parte onshore e parte offshore (no mar), que é muito pouco conhecida aqui no estado”, diz. “Esta bacia se conecta com Sergipe e Alagoas, onde foram descobertas reservas importantíssimas de gás natural. É uma formação geológica muito similar”, afirma.

Anabal Alves, consultor de negócios na área de petróleo e gás da Solução Energia, diz que a retomada na produção terrestre na Bahia se deve à atuação das empresas independentes. “Se olhar a curva de produção das empresas, há um padrão muito bem definido, elas assumem os poços e no mês seguinte já há um aumento expressivo de produção”, afirma. “Grande parte do sucesso se deu pelo estado em que os campos estavam, com competência, os resultados apareceram.

Segundo Alves, atualmente acontece um processo de consolidação do mercado independente, com movimentações de compras de ativos e fusões de empresas. “Isso é bom porque dá mais corpo para estas empresas, que vão crescer e abrir espaço para outras empresas menores investirem em campos de menor potencial”, analisa.

Para ele, os resultados poderiam ser bem melhores com a cessão de mais áreas para investidores privados. Ele cita como exemplo o caso do Polo Bahia Terra, operado pela Petrobras. A área chegou a ser embargada pela ANP, mas voltou a operar em um nível abaixo do seu potencial, acredita. “Esta área, que é a mais importante da Bahia vinha numa curva de produção decrescente e o esforço que a Petrobras consegue fazer é manter essa produção baixa”, analisa. Antes de 2022, os planos da estatal eram de transferir a concessão para a iniciativa privada. “Na minha visão, a Bahia sofre um enorme prejuízo porque o ativo está sendo mantido, mas não é produtivo como poderia”, diz.

Para o consultor ainda existem entraves legais e regulatórios que precisam ser tratados para que o mercado cresça com cada vez mais sustentabilidade. Um dos principais está na definição das pequenas e médias empresas do setor. Segundo ele, no Brasil estas definições são mais restritivas do que em outros mercados.

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