Economia da Bahia encolheu 3,6% em dez anos

Sem política de desenvolvimento, estado perde relevância econômica 

csm_centro_convencoes_da_Bahia_Foto_Marina_Silva_4966c16361Centro de Convenções da Bahia está abandonado (Marina Silva/CORREIO)

A Bahia viveu a pior década de sua história econômica entre os anos de 2011 e 2020. Se os primeiros anos do período ainda registraram algum crescimento – efeito de investimentos anteriores em maturação e de medidas para estimular o consumo adotadas pelo governo federal, os últimos resultados do Produto Interno Bruto (PIB) escancararam a ausência de uma política de desenvolvimento econômico para o estado. Em 2015, a queda foi de 3,4%, seguida de outra de 6,2% em 2016, crescimento zero em 2017, leves altas de 2,4% e 0,8% em 2018 e 2019, além de um recuo de 3,4% em 2020, neste caso já sob os efeitos da pandemia do coronavírus.

Desde 2007, quando o PT assumiu o comando do governo baiano, com Jaques Wagner, os resultados econômicos indicam uma estagnação no desenvolvimento estadual. Na época, a Bahia era a 6ª economia brasileira, atrás apenas de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná. Em 2011, a participação do estado no PIB nacional caiu de 4% para 3,8% e Santa Catarina assumiu o posto da Bahia no ranking. De lá para cá, a economia baiana vem oscilando na faixa dos 4%, enquanto a catarinense já alcançou 4,4% de participação. E mesmo entre os estados da região Nordeste, os resultados daqui deixam a desejar.

Por que o PIB é tão importante? O especialista no indicador Gustavo Pessoti, presidente do Conselho Regional de Economia da Bahia (Corecon-Ba) explica que o Produto Interno Bruto é um número que sintetiza tudo o que aconteceu numa economia num determinado tempo. Em bom português, significa pegar tudo o que se produziu na Bahia, em um determinado período e somar. No “economês”, “é uma grandeza monetária, que é agregação de valor da atividade econômica numa unidade de referência”.

“É um indicador muito útil porque permite entender a matriz produtiva de uma determinada economia, setores mais pujantes, que arrecadam mais, é um retrato fiel do nível de atividade econômica. É o indicador mais sensível do ponto das mudanças econômicas”, explica Pessoti.

O economista lembra, entretanto, que o PIB não é capaz de explicar tudo, porém é eficiente para mostrar se uma economia está crescendo ou não. No caso da Bahia, o retrato recente está muito longe de ser bonito, lamenta Pessoti. Desde o início das gestões petistas no estado, em 2007, até 2020, o crescimento acumulado do Produto Interno Bruto foi de 9,4%, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), órgão estadual responsável pela tabulação dos dados.

Entre 2011 e 2020, no que se poderia chamar de “década perdida” na Economia baiana, o resultado somado foi de uma queda de 3,6% no PIB acumulado, de acordo com os dados da SEI.

“Do ponto de vista econômico, infelizmente vivemos na Bahia um momento muito delicado”, reconhece o presidente do Corecon-Ba. “É um estado privilegiado, maior PIB da região Nordeste, principal estado exportador da região, tem todos os destaques de mercado de trabalho, mas os números mostram um cenário de desaceleração econômica sem precedentes”, avalia.

Pessoti lembra que este freio no crescimento aconteceu depois de uma década de intenso desenvolvimento na Bahia. Os anos 2000 marcaram, por exemplo, a chegada da montadora Ford e suas sistemistas, impulsionando o Polo Industrial de Camaçari. “A década passada se iniciou com muito boas perspectivas, a Ford chegou e coroou um processo intenso de atração de uma indústria de bens finais.

Ele conta que a década de 90, com os problemas causados pelo governo Collor e o processo de estabilização econômica com FHC, foi difícil para a economia baiana. “A Bahia viveu os anos dourados na década de 2000, foram anos extremamente favoráveis. Os investimentos industriais e o incentivo ao consumo trouxeram melhorias nos padrões da sociedade, fizeram novas atividades econômicas surgirem”, explica.

“Quando nós temos a virada de 2010 para 2011, esperava-se um continuísmo no processo de desenvolvimento”, conta. Não foi o que aconteceu, diz Pessoti. “Iniciamos o ano de 2011 com menos de 11% de desemprego e no início de 2020, antes da pandemia, portanto, tínhamos 22%”, compara.

Para o economista, o cenário nacional não deve ser usado como única explicação para o retrocesso econômico. Nem mesmo como a principal explicação, pondera. “Realmente, tivemos um segundo governo Dilma com uma política macroeconômica desastrosa, o que criou uma condição bastante negativa para todos. Mas se você traça os paralelos, se é uma crise para todo mundo, o comportamento precisa ser padrão e a realidade é que tivemos resultados piores”, diz.

Ele lembra que no Nordeste, apenas Sergipe registrou um desempenho pior que o da Bahia na década. Pessoti aponta o primeiro governo Rui Costa como o fundo do poço, economicamente falando. O Brasil inteiro cresceu pouco no período, mas nenhum estado decresceu tanto quanto a Bahia”, aponta. O resultado acumulado do PIB aponta um encolhimento de 7,3% na economia baiana no período, de acordo com os dados da SEI.

Foi neste período, em 23 de setembro de 2016, que o Centro de Convenções da Bahia (CCB) desabou, no que pode ser considerado um marco da política de Turismo do estado no período.

“Tudo o que está acontecendo neste período nos indica a urgência de uma política de desenvolvimento econômico. Entrou-se no senso comum de que melhorar socialmente se reflete na economia, mas a Bahia está andando para trás e precisa ir atrás das suas potencialidades”, avisa Pessoti.

Ele destaca o exemplo do turismo, que tem tudo para voltar a funcionar como um motor econômico no estado e precisa apenas de um bom plano para isto. “Temos um novo centro de convenções, um aeroporto modernizado, mas não dá para pensar que as coisas vão acontecer naturalmente, é preciso pensar numa política”, avalia. “O turismo é inclusivo demais para não ser valorizado”, acredita.

Perdas no turismo refletem falta de política pública 
O empresário Silvio Pessoa, presidente da Federação Baiana de Hospedagem e Alimentação (Fehba), acredita que o fechamento de grandes hotéis nos últimos anos é um reflexo da ausência de uma política de desenvolvimento para a atividade. “Nós tivemos uma estrutura de turismo e retrocedemos. O próximo governador da Bahia terá que recuperar uma estrutura que foi bastante sucateada nos últimos oito anos”, aponta.

“O turismo baiano perdeu capital humano, o conhecimento técnico, muitos profissionais deixaram a Secretaria do Turismo (Setur) e a Bahiatursa ou foram desligados. Temos uma empresa de turismo que resume a sua atividade a organizar festas de São João e shows em aniversários de cidades. Aí em 2016, desaba o Centro de Convenções”, lembra.

Segundo ele, não fosse a construção de um novo equipamento, desta vez municipal, o futuro da atividade seria ainda mais sombrio. “Nós vamos começar a perceber os efeitos do novo centro de convenções agora, mas não temos uma política para desenvolver a atividade no estado”, destaca.

Ele cita a necessidade de um planejamento para a atração de novos voos, principalmente internacionais. “O aeroporto de Salvador já foi o portão de entrada dos visitantes que vinham de diversos países europeus, como Portugal, Espanha e França. Hoje é preciso ir para o Rio e São Paulo antes de chegar aqui”, lamenta. “Faz muito tempo que os representantes do turismo batem nesta tecla, sem uma resposta efetiva.

Silvio Pessoa ainda acrescenta a defasagem na divulgação dos atrativos do estado. “Parece mentira, mas hoje a Bahia ainda não tem um banco de imagens estadual de seus atrativos turísticos. Vivemos no tempo do 5G, mas o poder público ainda é analógico”, aponta.

Potencial está sendo desperdiçado

Um dos principais motores para o desenvolvimento da economia baiana nos últimos anos, a agropecuária poderia ter dado uma contribuição ainda maior, avalia o produtor rural Humberto Miranda, presidente da Federação da Agricultura do Estado da Bahia (Faeb). Para ele os resultados conquistados nos campos baianos se devem aos esforços da iniciativa privada.

“A Bahia tem crescido na contramão da história. Com certeza, poderia ser muito melhor. Não temos uma política pública estruturada para o desenvolvimento do estado. Existem coisas pontuais, mas um projeto estruturado, não tem. O setor tem crescido no faro do empresário, que tem investido em ciência e tecnologia, por enxergar a oportunidade de vender alimentos para o mundo”, descreve Miranda.

Para ele, o que acontece atualmente é um desperdício do potencial que o estado possui. “A Bahia tem um potencial enorme, mas nunca teve um programa estruturado de desenvolvimento”, diz. Segundo ele, a última vez que se pensou algo no setor agrícola em nível estadual aconteceu ainda no governo Paulo Souto, quando se pensou num programa de reserva hídrica para o semiárido, com a construção de diversas barragens.

Humberto Miranda afirma que existem muitos gargalos a serem superados, mas aponta a falta de educação rural como o principal deles. “Qualificar, capacitar as pessoas é algo urgente. É aí que entra a questão da assistência técnica”, lembra.

“O próximo governador precisa fortalecer as organizações sociais. Isso precisar ser pauta nos próximos quatro anos. Onde nós temos discussões fortes, com participação de todos, temos verdadeiras democracias”, defende.

Mais espaço para a participação da iniciativa privada na discussão de políticas públicas também é uma prioridade apontada pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Ricardo Alban.

“Nós entregamos para os candidatos ao governo da Bahia caminhos pelos quais nós podemos colaborar com a administração pública. Eu destaco a educação, básica e profissional. Temos inclusive todo um programa pronto, que podemos passar para o novo governador”, diz.

Alban ressalta ainda a necessidade de ter na próxima gestão uma Secretaria de Desenvolvimento Econômico “forte, representativa e atuante”.
“A Bahia precisa ter na SDE o protagonismo de uma verdadeira política industrial. Durante muito tempo quem fez isso foi a Casa Civil, mas é uma secretaria que tem muitas outras demandas”, diz. Segundo ele, a Fieb tem conversado com a consultoria McKinsey & Company para oferecer ao próximo governo um plano de desenvolvimento. “Temos disposição para ajudar a fazer essa política. Nossa proposta é fazermos algo a longo prazo, um plano plurianual”, aponta.

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