Governo da Bahia não garante pagamento do novo piso salarial aos professores

Valor base teve aumento de quase 15% 

csm_csm_escolas_divulgacao_1b9d69d8fb_ed62d1361f(Foto: Divulgação)

anúncio do Ministério da Educação (MEC) de que neste ano o piso salarial dos professores passará a ser R$4.420,55 – o que representa um reajuste de 14,94% – virou motivo para uma queda de braço entre a União, estados e municípios. A decisão foi publicada no Diário Oficial de terça-feira (17), mas entidades se manifestam contra a medida. Na Bahia, o piso anterior, R$3.845,63, já não é pago a parte dos profissionais aposentados e professores dos graus 1 e 2.

Desde 2008, a Lei n° 11.738 estabelece o valor mínimo aos professores da rede pública de educação básica, em início de carreira, para a jornada de até 40 horas semanais e com reajuste anual. Após a eleição do presidente Lula (PT), o Ministério da Educação definiu o acréscimo de quase 15% nos salários.

O problema é que parte dos professores da Bahia não recebe nem o piso anterior e ações na Justiça exigem que o governo do estado cumpra a lei, como explica o coordenador-geral do Sindicato dos Professores da Bahia (Aplb), Rui Oliveira. Segundo ele, além da rede estadual de ensino, 90% dos municípios da Bahia não pagam o valor mínimo estabelecido por lei, inclusive Salvador. Em 2022, o reajuste foi de 33,24%.

“Uma resolução de 2012 prevê que se o estado ou munício comprovar que não tem capacidade de pagar o piso, pode solicitar ao MEC uma suplementação. Mas o Ministério vai querer abrir a caixa preta das contas e encontraria irregularidades”, afirma Rui Oliveira. Nem o sindicato e nem a secretaria estadual de Educação informaram quantos professores recebem remuneração base abaixo do piso.

Porém, a coluna Satélite, do CORREIO, revelou que uma auditoria realizada em 2021 pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta que quase metade dos professores da rede estadual receberam remuneração inicial abaixo do piso. Do total de 35.819 profissionais ativos à época, 16.479 (46%) tiveram vencimentos de base menores que R$2.886,24, valor então estabelecido.

Dentro das salas de aula, a má remuneração desmotiva profissionais qualificados. Daniela Cupertino, 47, possui duas especializações e é professora de artes visuais do fundamental 2. Moradora de Salvador, está há 23 anos trabalhando na rede estadual de ensino e recebe remuneração base, sem gratificações, de R$4.100 para 40 horas semanais.

A professora de artes visuais recebe menos do que o valor mínimo estabelecido por lei mesmo com duas especializações no currículo

(Foto: Paula Fróes/CORREIO)

Com a definição do novo piso, Daniela passa a receber menos do que o básico e espera que seu salário seja equiparado com o reajuste. “Quem estuda mais durante a vida começa a não ter vantagem porque o salário vai ficar o mesmo. Então, tanto faz o professor fazer uma pós-graduação ou não”, desabafa.

Vale lembrar que nas escolas privadas o piso dos professores é definido a partir de negociação entre o sindicato patronal e dos docentes. Quando um acordo é firmado, uma convenção coletiva com validade de um ano é assinada.

Em nota, o Sindicato dos Professores no Estado da Bahia (Sinpro), que representa os profissionais da rede particular, comemorou a provação do piso, mas defendeu que a remuneração dos docentes deveria ser superior. “É muito pouco e muito aquém do que se poderia chamar de justo”, pontuou.

Críticas ao piso

Um dia após o anúncio do novo piso, na segunda-feira (16), a Confederação Nacional de Municípios (CNM) defendeu que não há base legal para o reajuste. O novo valor, se cumprido, terá impacto anual de R$19,4 bilhões aos cofres municipais, de acordo com a entidade.

Apesar de ser estabelecido pelo governo federal, os estados e municípios são os responsáveis por custear o piso. A CNM alega ainda que entre 2009 e 2023, a receita do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação (Fundeb) aumentou 255%, enquanto que o reajuste do piso foi de 365%, o que teria criado problemas para a gestão da educação.

Procurada, a União dos Municípios da Bahia (UPB) informou que reconhece o mérito dos professores e reforçou que as prefeituras não possuem capacidade fiscal para a assegurar o pagamento. A entidade disse ainda que vai dialogar com o governo federal sobre o assunto, mas disse não saber quantos municípios descumprem o piso no estado.

O que diz a secretaria de Educação

A Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC), não informou qual a porcentagem de professores que recebem salário base inferior ao definido pelo piso de 2022. A pasta diz ainda estar realizando estudos para avaliar o impacto sobre o orçamento para a adoção do piso em conjunto com as secretarias da Fazenda e de Administração. Uma reunião deve ser realizada ainda nesta semana.

A secretaria de Educação de Salvador (Smed) não informou qual será o impacto do novo piso para o orçamento municipal. O Ministério da Educação (MEC) também foi procurado, mas não comentou o reajuste.

Sindicato não descarta greve de professores, diz Aplb

Existe a possibilidade de uma nova greve de professores no estado e municípios caso o novo piso não seja cumprido, como garante o coordenador-geral do Sindicato dos Professores da Bahia (Aplb), Rui Oliveira. Segundo ele, a categoria não irá medir esforços para que a lei seja colocada em prática no estado.

“Nós vamos continuar lutando e esperamos que o governo tenha sensibilidade para sentar e equacionar o pagamento. Não descartamos greve e tudo é possível”, afirma. O desejo do sindicato é que o reajuste dos seja aplicado na carreira dos professores de forma proporcional.

No ano passado, diversos municípios do estado enfrentaram greves de profissionais que exigiam reparação salarial. Em Eunápolis, no sul, a paralisação de parte da categoria durou oito meses.

Outra preocupação é com os profissionais aposentados que recebem menos que o piso, o que vai de encontro a lei. Luzia Gomes, 73, trabalhou como professora durante 32 anos antes de se aposentar e recebe mensalmente R$2.059 – menos da metade do valor estabelecido pelo novo piso.

“Eu ainda tenho esperanças de que um dia o estado veja a educação com outros olhos, mas a vida de professor era dura desde a minha época. Se eu não tivesse ajuda de familiares, não conseguiria nem bancar o apartamento em que moro”, desabafa a aposentada que vive no Imbuí.

*Com orientação de Fernanda Varela.

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